ARTIGO: MARGINAIS OU MARGINALIZADOS?

Paulo Antônio Locatelli
Promotor de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina
Vice-Diretor da Abrampa – Região Sul

 

Segundo o dicionário, a palavra marginal é polissêmica, pode tanto referir-se ao que está situado nas margens de um curso de água, quanto a quem foi excluído da sociedade, como também a quem vive desrespeitando leis, costumes e valores estabelecidos, sendo nessa última acepção um sinônimo de delinquente.

Aqueles que constroem às margens de cursos de água e da lei podem literalmente ser chamados de marginais ou marginalizados.       

Definem-se como marginais aqueles que, cientes do desrespeito às regras, edificam dolosamente em busca de obter vantagem ou lucro fácil ao empreender onde não pode, cometendo, por consequência, ilícitos cíveis, administrativos e criminais. Por seu turno, os marginalizados são as pessoas que buscam às margens de cursos de água como inevitável escolha para a sua única moradia decorrente da baixa renda. Independentemente de tratar-se de marginais ou marginalizados, o desrespeito é o mesmo, apenas a finalidade diversa. Não obstante identifiquem-se como marginais ou marginalizados, os danos ambientais, a desordem urbanística e os prejuízos sociais existirão. A presença de marginais ou marginalizados demonstra que o uso clandestino ou irregular do solo não distingue classe social, mas a diferencia quanto ao tratamento a ser adotado quando da regularização. Para regularizar núcleos informais urbanos constituídos por marginais, a lei impõe o marco ocupacional mais longínquo (maio 2012- Código Florestal), já para os marginalizados aplica-se data mais recente (julho de 2017 – Lei da Reurb).

Dos marginais, se exige todo o custeio de projetos, estudos técnicos e investimentos, além do ônus registral. Quanto aos marginalizados, o ente público deverá arcar com todo o procedimento e custos financeiros. Tanto marginais quanto marginalizados poderão se beneficiar de flexibilizações ambientais, edilícias e urbanísticas, devidamente indicadas diante da realidade enfrentada e de critérios técnicos.  

Marginais não poderão permanecer em área inferior a 15 metros do curso de água, já em relação aos marginalizados a lei não impõe recuo mínimo, mas ambos estarão sujeitos à análise do risco de desastres, que poderá impor metragem superior de recuo. Existindo ameaça de desastre para ocupações de marginais, estas deverão ser removidas. Por outro lado, em relação às ocupações de marginalizados em área com risco de desastres poderão ser adotadas medidas para eliminá-lo, corrigi-lo ou administrá-lo. Tanto marginais quanto marginalizados não foram isentos dos crimes praticados ainda que se promova a regularização pela Lei da Reurb (n. 13.465/17), sopesados os motivos, as circunstâncias e as consequências dos crimes. A análise técnica da Reurb pode implicar na permanência ou remoção de marginais ou de marginalizados, a depender do projeto e estudos técnicos socioambientais. Na hipótese de remoção, os marginalizados deverão ser realocados em outro local garantido-se a moradia. Por sua vez, os marginais serão obrigados a sair, arcando com a própria parcela de responsabilidade. Se a Reurb indicar a premência da remoção, os marginais investem do próprio bolso, os marginalizados não. Marginais e marginalizados em algumas ocasiões se confundem, dificultando a distinção e, por consequência, a definição quanto ao tratamento mais adequado a ser empregado. Ambos se valem da omissão fiscalizatória e da impunidade, sendo que os marginalizados ainda sofrem com a falta de políticas públicas habitacionais. Em comum também, o descaso, o desrespeito e o desdém dos setores públicos em conter as ocupações ilegais e garantir os serviços públicos essenciais e infraestrutura básica.

 

 

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